Feche seus olhos por um pequeno instante e se permita um pequeno exercício. Busque em sua memória afetiva mais distante as lembranças da escola que reside em você. Procure se lembrar dos detalhes que compõem a construção daquele espaço. O piso, o chão, as janelas, as pedras, as árvores… 

Agora reconheça as sensações que aquele espaço lhe entrega. Apenas sinta…

Pois bem. Esta é a prova viva e concreta da importância de se estabelecer e construir um espaço/escola que permita à criança o desenvolvimento de uma relação afetiva com este espaço.

O livro ESPAÇOS AFETIVOS: habitar a escola nos convida a um mergulho profundo sobre o tema. Através de perguntas, imagens, teoria, prática e pesquisa, Rayssa Oliveira, a autora, ancora o seu olhar e seus próprios questionamentos no cotidiano das escolas visitadas e no que seus olhos captaram. 

Nós, adultos, passamos a olhar os espaços com os olhos do “todo”, e deixamos de perceber o espaço das minúcias. Já as crianças são muito mais entregues aos detalhes. É exatamente neste ponto que, em geral, nos equivocamos na construção dos espaços a serem ofertados.

Todos os seres desenvolvem laços afetivos com os seus ambientes. Estes laços se desenvolvem ao longo da vida e sempre. Ocorre que, na infância, durante o processo de construção dos laços, as percepções estão muito mais aguçadas e atentas aos micro lugares. É muito comum nos recordarmos de pequenos detalhes do piso (que se pareça a um formato de animal), uma mancha no quadro negro (que se assemelhe a uma nuvem), uma frase escrita na carteira… Aos olhos da criança cada detalhe tem valor, porque ela busca neles “sentido”. Daí a formação do vínculo afetivo.

Mas como disponibilizar um espaço rico para estas observações e afeições, especialmente nos grandes centros, onde os espaços das escolas são projetados a partir de construções pensadas inicialmente para outros objetivos? 

Claro que se reconhece o desafio em se organizar um ambiente adequado para a escola, a partir de um imóvel projetado para ser uma residência ou uma empresa. Os conceitos são absolutamente diferentes. Mas um olhar atento e o desejo de receber não apenas “crianças”, mas de receber sentimentos, sensações e relações, pode colaborar, em muito, no alcance de um espaço repleto de ofertas.

Vale refletir que para cada pequeno detalhe do espaço corresponde um sentimento (bom ou não tão bom) a ser instalado na criança. Quais são as sensações que desejamos deixar nelas? O quanto estas sensações têm influência direta em seus aprendizados, em suas experiências e em suas descobertas?

Suas salas de aula são tão acolhedoras e aprazíveis quanto a sombra de uma árvore? Certamente a resposta é “não”. E porque a sua aula não pode se desenvolver sob esta mesma sombra de árvore, formatando uma excelente e desejada relação de afeto que inclui, além do espaço bom de se estar, o professor e seu conteúdo?

Rayssa Oliveira em sua obra nos convida a pensar, por exemplo, em árvores como lugares. A autora nos diz:

“(…) Não se faz escola sem árvores. Ao menos uma é suficiente para deixar memórias duradouras de vivências, marcadas no corpo, junto a uma pitangueira, uma aroeira, um pé de jambo(…)”

Há muito a se refletir sobre os espaços e as sensações das crianças. Porque não basta projetá-los e construí-los. É necessário disponibilizá-los. As crianças precisam e merecem ter acesso aos espaços pensados. 

Não é bom termos um gramado onde não se possa pisar, sentar ou ficar. Nem parece ser muito proveitoso termos uma árvore cujo tronco não possa ser, no mínimo, tocado ou abraçado. 

Quando se pensa numa escola afetiva é preciso que se tenha em mente que não basta estar sorridente no horário de entrada das crianças, abraçá-las e recebê-las com carinho (ainda que isso seja desejável). Mas é um direito das crianças (e dos adultos que por lá estão) que os espaços fomentem e mantenham acesas as chamas da afetividade, do acolhimento e das sensações

A composição de nossas crianças não se resume aos conteúdos que devemos entregá-las, mas ao conjunto de complexidades que são inerentes a elas. Como ressalta Rayssa:

“Escola é lugar para a gente habitar.”

O mais importante é que reconheçamos estas importâncias. Para estarmos postos e dispostos as reflexões, conhecermos nossos acertos, reconhecermos nossos erros e mudar. Mudar o olhar, mudar o lugar e o modo de usar.

Abra seus olhos… Abra seu coração… Abra seus espaços!!!

Afinal, qual a escola que te habita?