No mês de abril, é comum muitas escolas trabalharem as temáticas indígenas com as crianças. O dia 19 se tornou uma data de reflexão sobre a história dos povos originários no Brasil, seu extermínio ao longo do tempo e as reivindicações das comunidades nos dias de hoje. Sabemos que, para se entender a formação do Brasil, é preciso que essa temática esteja presente durante todo o ano, até porque estamos vivendo uma época em que nunca se falou tanto sobre preservar o planeta. É praticamente impossível desassociar uma coisa da outra, não é mesmo?

Escritor Maraguá Yaguarê Yamã

É fundamental que todo educador fique bastante atento às transformações e atualizações das terminologias e da forma de falar ou apresentar às comunidades indígenas para os seus estudantes. O que antigamente não era visto como algo preconceituoso, hoje pode ser ofensivo. A primeira delas diz respeito ao próprio nome. Se antes falávamos “Dia do Índio”, hoje falamos “Dia dos Povos Indígenas”. E você sabe o por quê?

Daniel Mundukuru, uma das maiores referências indígenas no Brasil, disse: “Eu não sou índio, sou Mundukuru”. O escritor Yaguarê Yamã também afirma “Eu não sou índio, sou Maraguá”. A generalização do termo é prejudicial para a preservação das identidades das centenas de comunidades indígenas no Brasil. “Saber chamar as etnias pelo nome é respeitar e valorizar as mesmas em sua essência. Imagine um mundo só de uma cor ou que tenha só uma espécie de árvore ou de borboleta”, afirma Yaguarê Yamã. O escritor, ilustrador e geógrafo amazonense, crescido no Paranã do Urariá, município de Nova Olinda do Norte, localidade de Novo Horizonte Yãbetue’y, aldeia indígena da etnia maraguá, tem livro vendido pela Livraria Diálogos e bateu um papo com a gente sobre educação indígena diretamente do Amazonas.

“Dia do índio ficou para trás”

“O preconceito nasce com estereótipo. E só existe estereótipo quando existe ignorância. Esse muro só cai quando existe a convivência, quando os seres humanos começam a conhecer realidades diferentes das suas. Essa história do ‘dia do índio’ ficou para trás, não somos uma coisa só. Somos plurais até mesmo nas nossas individualidades. A escola, nesse processo, tem sido fundamental. A gente vê, pelo Brasil todo, que muitos professores se esforçam nessa mudança de olhar, estão atentos às pautas e às mudanças. Geralmente, o brasileiro não se vê no espelho, não vê sua ancestralidade. Olha pra fora e se vê na Europa, nos Estados Unidos, sabemos da influência que recebemos desses lugares. Dessa forma, se a gente não olhar pra si, repetiremos o olhar colonizador”.

Povo Maraguá, no Amazonas. Foto:  Yaguarê Yamã

Ainda falta muito

“São culturas e tradições muito antigas. Esses povos são nações e cada nação tem seu território histórico, que representa a sua identidade. O Brasil não é nação, é um Estado Plurinacional, como a Bolívia, Canadá e Nova Zelândia. Reconhecer a diversidade de todos esses povos é fundamental para se entender o que é o Brasil. Existem territórios históricos que não são demarcados, isso facilita a invasão de madeireiros, pesca ilegal. Na região onde moro, que poderia ser demarcada, existe uma rota de tráfico de drogas e de exploração ilegal. Quem ganha com isso? Os indígenas são protetores de suas terras, isso ajudaria muito o governo e promoveria políticas públicas para as comunidades. Os indígenas não são atrasados como muita gente pensa. Tem coisa mais atual que o desenvolvimento com a preservação ambiental?”.

Literatura indígena como aliada

“Iniciamos esse movimento com diversos escritores e escritoras nos anos de 1990, meu primeiro livro foi lançado em 1999. Tenho 37 livros publicados. Isso é representatividade. Entramos na literatura indígena como forma de conscientizar e buscar aliados de um jeito inédito. As publicações aumentaram muito o respeito aos povos indígenas, já que as pessoas passaram a conhecer as culturas através dos livros. É uma forma de mostrar a beleza das crenças, das histórias, autenticidade e verdade. Fazemos uma literatura em prol da brasilidade, de um Brasil autêntico, real, diverso. Temos mais de 300 povos nativos, imagine se cada um deles tivesse um representante na literatura?”

Povo Maraguá, no Amazonas. Foto:  Yaguarê Yamã

Cocarzinho Amarelo

“Pensei nesse livro como uma forma do Brasil se identificar com sua raiz. Me veio à cabeça a história da ‘Chapeuzinho Vermelho’, europeia e muito conhecida. Trouxe o contexto para o Brasil. Pensei na paisagem, no ambiente, na realidade, tudo voltado para aguçar a curiosidade da criança, que é transformadora. Eu atuo em prol da representatividade e vejo que a criança é uma grande aliada. Dessa forma, ao invés de um ambiente da floresta negra, trouxe a Floresta Amazônica; ao invés de uma menina branca, trouxe uma criança indígena; ao invés do lobo, uma onça”.

Na Diálogos, temos uma livraria onde você pode encontrar uma série de livros que tratam não apenas dos povos indígenas, mas de muitas temáticas que nos informam, formam e transformam a educação. Vamos juntas?