A história da evolução da nossa espécie é marcada pela busca de alimentos, ferramentas e conhecimentos. 

Atualmente, basta apertarmos um botão e em alguns minutos o alimento estará em nossa mesa, também podemos realizar uma breve pesquisa e encontramos diversos modelos de ferramentas, seja ela um objeto ou um aplicativo que irá suprir a nossa necessidade. 

Já a busca pelo conhecimento é, e sempre foi, a maior jornada da vida humana. 

Uma das passagens filosóficas mais famosa é o Mito da Caverna, e sua fama não é por acaso. Platão, filósofo grego, através dessa alegoria, nos provoca a compreender que quando não buscamos o conhecimento, permanecemos acorrentados a ilusões e a falta de sentidos à realidade em que vivemos.

O conhecer é tão entusiasmante e contagiante que eu o considero o mais importante processo de relação do ser humano com o mundo. 

Essa relação pode acontecer de diversas maneiras, mas quando o antropólogo David Le Breton afirma que “para o homem não existem alternativas senão experimentar o mundo”, ele nos traz a compreensão de que se relacionar com o mundo por meios dos nossos sentidos, é a nossa principal matéria produtora de conhecimento. 

Conhecer é sempre uma procura! O ser humano está a todo instante, através do seu corpo, interpretando o seu entorno. 

Certa vez, tive a alegria de acompanhar um grupo de estudantes do ensino fundamental 2 em uma trilha em meio a mata atlântica. Todos caminhavam curiosos e observadores. Percebi que cores distantes daquele básico “verde de pintar folhas no caderno” lhes chamavam muito a atenção. Como assim uma folha é laranja? Uma menina me perguntou. 

Em um determinado momento da trilha, chegamos no topo de uma grande rocha e que permitiu a todo o grupo observar o horizonte. A imagem a nossa frente era paralisante, rica em diversos tons de cores, sons e temperaturas. Resolvi caminhar lentamente e apenas escutar as percepções desses estudantes maravilhados em sentirem algo pela primeira vez. 

“Gente, gente o vento é gelado!” pude escutar um menino dizer enquanto esfregava suas mãos nos braços. “O sol brilha”, gritou a menina que tapava o rosto com as mãos. Resolvi, então, me sentar ao lado de uma menina que observava, de forma hipnotizante, algo a sua frente. Após alguns poucos minutos, ela quebra o silêncio “então isso que é o horizonte, uma linha que todo mundo vê mas nem o passarinho chega lá”. 

As experiências sensoriais e perceptivas vividas por esses estudantes, se tornaram conhecimentos por meio de uma relação recíproca e de empatia, entre sujeito e meio ambiente – o mundo.

 A percepção das coisas, como “o vento é gelado”, não é uma mera coincidência, mas uma importante interpretação onde o corpo é o princípio e o principal objeto de estudo. 

Neste ponto, quero dizer que é importante nos entregarmos com liberdade na busca pelo conhecimento, tendo como ponto de partida o princípio da diversidade que existe em nós e no mundo, ou seja, ninguém aprende de forma igual e não existem duas pedras idênticas na natureza. Esse princípio, o da diversidade, deve nos indicar os novos caminhos para o aprofundamento onde, ao descobrir que “o vento é gelado”, a próxima busca não seja sentado atrás de outros estudantes, escrevendo por horas em papéis padrões com linhas retas, como mero espectador, sobre os motivos do vento ser gelado, mas sim, ter a possibilidade de conhecer, por meio de inúmeras possibilidades de pesquisas e interpretações sobre temperatura, velocidade, altitude e tantas outras variáveis que tornam o vento gelado e a partir dessas compreensões, realizar um registro dessas percepções. 

Para conhecer é preciso estarmos em cenários onde diversas ações, percepções e evidências como “o sol brilha” possam acontecer. Os nossos sentidos, não experimentam o mundo numa relação certa ou errada, mas o percebe de forma individual e por meio das sensações inéditas que nosso corpo está interpretando. 

É daí que vem a minha afirmação: a educação precisa de pessoas especializadas no inédito! As propostas, programas e métodos educativos precisam atribuir significados a toda e qualquer experiência de aprendizagem. 

O conhecimento só tem sentido quando ele dá sentido ao que vivemos, ou seja, quando ele penetra no campo da consciência e das significações, tornando o conhecer uma tarefa infinita na busca por respostas.

Um outro ponto de vista que desejo compartilhar é que “o conhecimento é o mais importante dos afetos”, como dizia Spinoza. Esse afeto nasce do desejo da conservação, da proteção e do cuidado.

No ato do seu discurso, quando ganhou um prêmio Nobel de Medicina em 1996, após a descoberta de uma proteína importante para o crescimento e sobrevivência de neurônios, a neurocientista Rita Levi-Montalcini disse “eu nunca pensei apenas em mim mesma, todo meu conhecimento foi para cuidar de nós”. 

Conhecer é tornar o inédito em realidade. É descobrir o novo. É compreender a importância da diversidade. É sentir-se capaz.

Conhecer é levar nossos sentidos para experimentarem o máximo de realidade que o mundo têm a nos oferecer.

Conhecer é uma suave e afetuosa procura. Ora do mundo. Ora do outro. Ora da gente!

Renata Stort é filósofa, cientista social e pedagoga.